Mosaico

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Quadrilha atualizada

Nestor lamou Gleise que lamou Richa
que lamou Requião que lamou Izabella
que lamou Lula que lamou Aécio 
que lamou Cunha que lamou Dilma

que lamou Mariana, que nada tinha a ver com a história.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Poeira Digital Movediça

Roberto vivia indignado com as questões do mundo, com as questões universais. Ele acompanhava compulsivamente as principais notícias das redes sociais. Com seus likes e compartilhamento se engajava pelos direitos dos animais, dos humanos, a favor da família, contra a família, a favor da vida, a favor da morte, a favor do casamento, contra o casamento. Roberto se sentia parte do juízo justiceiro confortável em seu smartphone. 

Roberto andava olhando para baixo, mas não para as pessoas, para sua tela brilhante. Esse conforto o irritava, mas não percebia. Como uma coceira, digitava em seu celular, apagando os erros do corretor ortográfico. E isso o irritava mais ainda. 

Roberto se engajou tanto nas questões do mundo que parou de arrumar o quarto, parou de beijar sua esposa, parou de brincar com seus filhos. Afinal, o mundo estava em colapso. Morre leão nas mãos de humanos cruéis. E mais um tropeço no mendigo que atrapalhava seu caminho.

Roberto não tinha tempo para a humanidade, afinal estava resolvendo as questões universais com seus dedos, likes e shares. 

Mais um passo tropeçado num outro humano atrapalhado. E a cada passo, se afundava na areia movediça digital, até que percebeu que estava se afogando em seus salvamentos justiceiros diários. 


Enquanto se afogava, alguém lhe estendeu a mão, mas Roberto não conseguiu alcança-la, pois preferiu digitar hashtag meajudem hashtag socorro hashtag cadeahumanidade.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Processo de ilustração em aquarela


Processo de pintura em aquarela


O poeta e a água

De dentro do poeta, a arte funciona como água.
Pode tentar conter toda a arte possível, mas ela encontra uma saída, nem que seja por uma pequena fresta.

O artista (quando não famoso), em sua maior parte do tempo, leva um trabalho paralelo, disfarçado de profissão principal. Esse trabalho serve apenas para pagar as contas diárias e patrocinar a produção de sua própria arte. É sofrido, cansativo e as vezes falta esperança, mas quem sabe, o Rubem Alves esteja certo mesmo, quando já dizia que ostra feliz não faz pérola.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

A Voz do Limite

Despertou de um sonho que jamais veria novamente. Poucas lembranças ficaram, apenas impressões. Com seu despertar veio a estranha sensação de ressaca e um sussurro tímido. Sussurro que estava anestesiado até então. Esse sussurro a fez caminhar e buscar seu destino. 

O sussurro cresceu a medida em que a saudades do sonho aumentava. Uma pequena voz se tornou um eco audível que tomava todos os espaços de sua acústica.

Ivi pôs-se a caminhar. Buscou saciar aquela voz, sem saber que assim o fez. A voz a impelia trilhar pelas linhas do limite. E aquele sussurro tornou-se a Voz do Limite. 

A Voz do Limite fez Ivi procurar por grandes realizações, quando os caminhos do mundo não lhe foram suficientes, acentou-se em terras frutíferas. Mas os frutos da terra não lhe foram suficientes. 

Ivi passou a construir grandes obras, grande empreendimentos, mas a cada final a Voz do Limite aumentava no profundo espaço de seu coração. Ivi foi para o deserto, e naquelas areias usou grandes pedregulhos para fazer um templo. Nesse santuário fez sacrifícios, mas ainda assim, a Voz do Limite ecoava. Sacrificou suas plantações e sementes, depois entregou filhos seus, e depois passou a se cortar, mas a Voz do Limite trepidava ainda mais forte.

Percebeu que o templo era pequeno demais. Ivi subjugou seus filhos para que construíssem maiores templos, mas nenhum deles calava a Voz do Limite. 

Ivi passou a peregrinar em terras ainda desconhecidas, ali encontrou a Razão. Razão era austera e sábia. Contou a Ivi todos os segredos que continha. Convenceu Ivi que ali encontrava-se toda a realidade. Mas por algum motivo, a Voz do Limite não cessava. Ivi passou a acreditar que no dia em que se obtivesse todas as informações que a Razão possuia, a Voz do Limite cessaria.

Certa vez, Razão convidou Ivi para passear sobre os limiares de suas terras. A Voz do Limite a impeliu para que olhasse para depois do abismo. Ivi chegou perto do limiar e ficou encantada com as linhas que se aproximavam. Quando olhou para o abismo, a Razão a empurrou para o absurdo.

Ivi caiu em queda livre no abismo Absurdo e nem Razão poderia resgata-la. Por muito tempo se debateu no ar, quando percebeu que a queda era inevitável, começou a dançar no rítimo da queda. 

Em queda, Ivi lembrou de seus templos, e construiu outros templos, cada vez maiores, onde seus filhos levariam ofertas diárias de sacrifício de horas de trabalho, de tempo de família, de tempo presente e contemplação. Seus filhos trocavam todos os seus valores por pequenas coisas que tinham preços. Preços cada vez maiores a medida que seus desejos aumentavam. 

A Ivi foi dado o poder de observar seus filhos, enquanto era sugada pelo Absurdo. 

Mas ainda assim, a Voz do Limite não se calava, ao contrário gritava, em tão altos decibéis que se confundia nos barulhos de lata, ferro e fogo. 

Foi quando ao longe avistou a Grande Pedra, que caía do céu em tão grande velocidade que pôs todas as construções antigas em pedaços. Seus templos de ouro, prata, bronze e suas últimas construções em parte de ferro e parte de barro foram limpadas dos limites. 

Da Grande Pedra nasce uma árvore, essa dá suas flores e depois de um pequeno calor, frutos. Frutos tão lindos e desejáveis que assustava a própria Voz do Limite. 

Esses frutos tinham aroma da saudades do sonho esquecido. Mas os filhos de Ivi estavam perdidos em seus próprios medos e desejos. Alguns pararam e olharam a árvore na Grande Pedra, e esses começaram a subir o rio, remando contra a correnteza, para chegarem até a árvore. 

Os outros, desciam o rio, e se jogavam no Absurdo. 

Da árvore da Grande Pedra, saiu um fio vermelho que laçou Ivi que estava dançando em queda livre. Ivi juntou tantos filhos quanto pode, para sentarem-se debaixo da árvore. 

Da árvore cai uma bela fruta que se partiu em muitos pedaços, tantos quanto o número de filhos de Ivi. Quando Ivi e seus filhos provaram a fruta, sentiram o sabor do paraíso e nunca mais a Voz do Limite pôs-se a falar novamente.


quarta-feira, 13 de maio de 2015

Incontrolável

O hobby do Antônio era controlar. Ele controlava tudo. Tinha prazer em ter planilhas e alimenta-las o tempo todo. 
Ele registrava os minutos que utilizava para escovar os dentes. Percebeu que de manhã utilizava 2 min 20 seg a mais para escovar em relação após a refeição do almoço.

No almoço contabilizava quantas vezes cortava o pedaço do bife, contabilizava a quantidade de mastigadas do arroz. Ele vivia em função desses números. Certa vez percebeu que havia muitas planilhas e que estava se perdendo nelas. Resolveu planejar as planilhas. Fez planilhas das planilhas. Tantas células para alimentar e não eram as células do corpo que lhe preocupava, mas as eletrônicas. Apesar que já havia pensado em contar a quantidade de fios de cabelo que tinha em sua cabeça, em quantas células tinha em seu corpo, mas isso foi impossível.
Antônio era muito preocupado e estressado, ele não conseguia contar tudo. Ele não conseguia ter o controle de quantos passos dava até a padaria, pois as vezes se deparava com um pedestre distraído, um cachorro esfomeado ou um ciclista que insistia em utilizar a calçada.

Uma vez lhe perguntaram porque ele contava tanto. Era óbvio que contava e anotava tudo para que tivesse controle. Controle da sua vida, controle de seu ambiente, controle do Universo.

O controle se tornou a loucura de Antônio. Ele parou de sair de casa, pois não tinha o controle da quantidade de passos. Ficou cada dia mais estressado quando percebeu que não podia contar quantas células tinha no corpo, quanto cabelo tinha no couro. E os cabelos caiam, ele tinha que começar a contagem novamente. 

Antônio se prendeu no seu controle e a vida insistia em ser incontrolável. 


Antônio, liberte-se disso! Seu controle nada serve. Seu controle é uma ilusão de estabilidade. Seu controle é um ídolo, um ídolo que o consome dia após dia. Livre-se de sua loucura! Antes que seja tarde e que não haja mais segundos para contar em sua vida. 

Marcelo Bittencourt