Mosaico

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Incontrolável

O hobby do Antônio era controlar. Ele controlava tudo. Tinha prazer em ter planilhas e alimenta-las o tempo todo. 
Ele registrava os minutos que utilizava para escovar os dentes. Percebeu que de manhã utilizava 2 min 20 seg a mais para escovar em relação após a refeição do almoço.

No almoço contabilizava quantas vezes cortava o pedaço do bife, contabilizava a quantidade de mastigadas do arroz. Ele vivia em função desses números. Certa vez percebeu que havia muitas planilhas e que estava se perdendo nelas. Resolveu planejar as planilhas. Fez planilhas das planilhas. Tantas células para alimentar e não eram as células do corpo que lhe preocupava, mas as eletrônicas. Apesar que já havia pensado em contar a quantidade de fios de cabelo que tinha em sua cabeça, em quantas células tinha em seu corpo, mas isso foi impossível.
Antônio era muito preocupado e estressado, ele não conseguia contar tudo. Ele não conseguia ter o controle de quantos passos dava até a padaria, pois as vezes se deparava com um pedestre distraído, um cachorro esfomeado ou um ciclista que insistia em utilizar a calçada.

Uma vez lhe perguntaram porque ele contava tanto. Era óbvio que contava e anotava tudo para que tivesse controle. Controle da sua vida, controle de seu ambiente, controle do Universo.

O controle se tornou a loucura de Antônio. Ele parou de sair de casa, pois não tinha o controle da quantidade de passos. Ficou cada dia mais estressado quando percebeu que não podia contar quantas células tinha no corpo, quanto cabelo tinha no couro. E os cabelos caiam, ele tinha que começar a contagem novamente. 

Antônio se prendeu no seu controle e a vida insistia em ser incontrolável. 


Antônio, liberte-se disso! Seu controle nada serve. Seu controle é uma ilusão de estabilidade. Seu controle é um ídolo, um ídolo que o consome dia após dia. Livre-se de sua loucura! Antes que seja tarde e que não haja mais segundos para contar em sua vida. 

Marcelo Bittencourt